terça-feira, 4 de agosto de 2009

CÂNTICO RÚSTICO

CÂNTICO RÚSTICO

FRANCISCO MARQUES DA SILVA


FORTALEZA / CE.

Apresentação

Escrever não é apenas um trabalho intelectual ou um arroubo da inspiração, mas um trabalho braçal, físico que leva o seu autor a tirar sangue dos olhos e da alma. O triste de tudo isso é que, em muitas ocasiões, tanto esforço não se faz compreensível pelos leitores que, também, nem concordam com as idéias de seu autor.

No ato da escrita, a opinião de outrem é o que menos vale: a idéia e a inspiração que não se sabe de onde vêm ou para onde vão é o que importa porque, do mesmo que surgem, desaparecem sem deixar vestígios ficando o poeta, então, perdido numa busca infrutífera de sua produção. Contudo, só depois, muito depois de um reencontro com elas, o rascunho de um texto aparece desafiando o artista que sai deixando entrar na parceria o artesão da palavra para que ele seja o seu algoz primeiro, pois, a partir desse momento, o texto adquire vida própria e segue o seu caminho nas mãos, nas bocas e nos olhos do leitor que irá tecendo a sua opinião dependendo do grau de sensibilidade mútua do leitor e do autor que darão razão a existência da obra escrita e lida.

Um dos estilos de composição que mais sofre o crivo da crítica é o poético porque ele toca de um modo particular quem o ler; ora, chegando à raia da pieguice, ora da realidade fria e parnasiana. Nesse CÂNTICO RÚSTICO, não procurei ficar preocupado nem com uma coisa, nem com a outra. Apenas deixei fluir o sentimento expresso em cada palavra, em cada verso que se tornou um grito de liberdade ao meu espírito ansioso por ser ouvido e acalentado.

DAÍ-ME FORÇAS, OH MEU DEUS,

QUE MEU GRITO

É UM SUSSURRO PERDIDO

NA IMENSIDÃO DO UNIVERSO.


A busca da pessoa amada nos leva a não se enquadrar em nenhum estilo literário, porque o importante é o sentir, o viver, o buscar as esperanças no aconchego de um abraço ou no calor de um beijo ardente. Isto é ser gente, isto é ser humano e, nesse ponto, por mais que não se queira aceitar, todos somos iguais mesmo que se esconda por trás de uma máscara estampada em nosso rosto.

VENS, MULHER, QUE DE AMADA,

AGORA, PASSOU PARA UMA NECESSIDADE MAIOR

DE QUERER-TE E QUERER-ME

COMO SOMOS NA SIMPLICIDADE DAS COISAS

PROVOCANDO-NOS UM DESEJO MAIOR

PARA BUSCAR A VIDA

ONDE NÃO HÁ A GERMINAÇÃO DAS ROSAS.


Assim é esse CÂNTICO RÚSTICO, uma preocupação apenas com o momento e com as razões de se atender a voz pura e musicada pelo encordoamento vibrante desse instrumento maluco chamado coração.


POR ISSO, POR QUE NÃO OLHARMOS

ALÉM DE NOSSAS ALMAS

E DEIXARMOS OS QUE OS ANJOS

ILUMINEM-NOS O CAMINHAR

SOLIDIFICANDO A PUREZA DE NOSSO

AMOR

NA ARDÊNCIA VIVA DO FOGO DESSE SENTIMENTO

QUE, QUANTO MAIS QUEIMA, MAIS PURIFICA

NOSSA CONSCIÊNCIA E O NOSSO ESPÍRITO?

Francisco Marques da Silva


QUERER-TE


Nunca te quis apenas carne,

Nem apenas por alguns momentos de prazer,

Mas como vida e garra nesse caminhar

Às vezes, tão complicado

A nos esmorecer as forças.


Sei da felicidade que te causo

E do mal criado para nos torturar

Impedindo a pureza desse divino sentimento

Crescendo a cada dia

Solidificando as nossas almas.


Eu não te quero apenas corpo,

Mas tu como um todo: fogo e paixão,

Sonho e realidade,

Dia e noite,

Carne e espírito


Nessa ardência da vida que nos faz

Tão bem pela verdade que existe

No íntimo das coisas simples

Criadas por nós, nos dando a coragem

Para enfrentarmos as asperezas da vida.


Eu te quero mulher companheira,

Amada e amante,

Porque só seremos felizes

De braços dados refazendo a vida

Rolando no bater das horas.



CÂNTICO RÚSTICO


À noite, quando todo o meu corpo

Ânsia repouso, o medo

Apodera-se de mim e o homem foge,

E o menino desprotegido surge.


Sinto não mais haver a força, o riso

E a vontade de viver

Não mais viaja em mim,

E não me encontro, e não reflito

Naquilo que sou na caminhada do dia.


Há uma vontade louca de me matar,

Uma vontade louca que não tem jeito

De não mais olhar as estrelas

E abraçar o nada...

E o medo cresce vertiginosamente:


Medo do desconhecido,

Medo da vida,

Medo de mim,

Medo de ti...

E o medo da perda

De não mais sonhar o sonho,

Essa idéia palpitante e vaga,

A me conduzir ao nada.



À noite, o menino desprotegido

Recolhe-se no frio da solidão

E a esperança

De caminhar contigo

A semear a vida

Vê que não há mais a correspondência:

O amor unilateral é vago

E sem razão de existência.


O homem, o herói e, talvez, um deus,

Um mito a se iludir com a vida,

Deixa de existir no vago da solidão

E o destrói no choro e no medo:

Medo do desconhecido,

Medo da vida,

Medo de mim,

Medo de ti

Na busca da imagem existente que fui

Dando-te forças para agarra o infinito

E, hoje, não é mais que um menino

Se desprotegendo da vida

A perder a cada minuto que passa,

O desejo em ti de buscá-lo

E o aconchegá-lo em teu peito

Para que posso gritar aos ventos

Que viver, ainda, talvez, valha a pena.


ACEITAÇÃO


Eu não queria aceitar,

Mas tuas palavras amadureceram

Meu coração que busca motivos

Para aceitar a vida

Real como sempre foi.


Eu não queria aceitar

Que, para sorrir,

É preciso trancar-se em si,

Buscando a solidão como companheira,

Não tão inseparável,

Mas aceitável.

Eu não queria aceitar

Que, em tua fragilidade de menina,

Há a realidade da mulher

Pé-no-chão e de coração sincero

A olhar constantemente o horizonte

Buscando a vida ardente de nosso ser.




Eu não queria aceitar

Tudo isso que disseste,

Mas o bom senso

Leva-me à aceitação de ti

E dessa realidade a que me conduz

Como os rios correndo para o mar

E o meu sangue,

A viagem mágica em tuas veias

A nos levar ao cume da montanha.



BUSCA





Como é que se pode cantar,

Quando o amor se despede

Do corre-corre da vida do povo?


Como é que se pode cantar

Quando não há mais tempo

Para olhar a simplicidade da vida?


Como é que se pode cantar

Quando o abraço cruel dos interesses

Materializa-se nos corações humanos?


Como é que se pode cantar

Quando não há mais a graças

Nos abraços que a esperança nos dar?


Contudo é preciso encontrar

Motivos para a canção

No fio tênue da beleza,

Na força que se cria

Na procura da sabedoria

E nas vibrações dos sons...


...a esperança é a única que não morre

No enfraquecimento do espírito:

Dai-me forças, oh meu Deus,

Que meu grito

É um sussurro perdido

Na imensidão do infinito.




SOLIDÃO



Nada é tão difícil de suportar Quanto sentir-se sozinho:

A solidão amedronta,

Aterroriza,

Tortura

Como um cruel algoz.


Talvez, não fosse tão difícil suportar

Tão incompreensível dor,

Se ela acontecesse por desejo

De buscá-la como fonte de inspiração

E, não como obrigação de tê-la

Como companheira inseparável

Onde o teu riso,

A luz do teu olhar

E a ardência de teu corpo

Buscam a distância de mim

Como solução para solidificar o amor.



Desta forma, a solidão é tortura

Porque torna cada segundo,

Micro fração do tempo,

Uma eternidade de tua ausência.



CÂNTICO DA ENCANTADA

ESPERANÇA



Onde andará a esperança fugindo de mim Na sucessão das horas e no correr dos dias?

Andará, então, na música do rádio, ao longe,

Cujas letras parecem terem sido escritas para mim

Onde a cada batida dos instrumentos

Aumenta mais ainda essa dor desatinada,

Ou estará a esperança em tua foto,

Ali, em repouso, na parede, exibindo teu riso

Belo sussurrando em meus ouvidos uma canção alegre

Dando-me forças para eu seguir adiante?

Onde andará a esperança

Se, para mim, os dias passam

Sem a graça do alvorecer,

Sem o frescor das manhãs

Vendo crescer mais ainda a necessidade

Do calor de teu corpo cobrindo o meu?



Que bom saber de tua voz numa música doce Dizendo:”oh, menino velho, a lua É a mais bela dama da noite. Vá vivendo, Tenha calma, o futuro, Deus dará.”

Onde andará a esperança

Quando a sombra negra da morte

Tão indesejada sorrir zombeteira,

Chamando-me constantemente

Para o aconchego de seus braços

Parecendo uma solução

Mais adequado aos meus lamentos?

Contudo, o meu medo ainda grande,

Dá-me coragem para rejeitar

Impiedosamente os seus encantos.


Onde andará a esperança

Teimando

Em não mais me sorrir

Enquanto o encanto de tua voz, ao longe,

Trazia a preocupação ingênua comigo

Se o banho que refaria as minhas forças

Foi tomado, ou se o almoço me fez bem?


Onde andará a esperança?

Olho-me no espelho e vejo o meu rosto

Que nem é mais o meu rosto

Com o riso e o brilho da pureza

Dos anjos que nos acompanham;

Sinto não me reconhecer nesse rosto envelhecido

Sem graça, triste e tão caído

Atropelando os sonhos.

Todavia, lá no fundo de meus olhos,

Uma chama tênue, ainda fraca,

Brilha nestas pupilas cansadas

E maltratadas pelos caminhos que trilhei,

Pelos sapos que engoli,

Pelas lágrimas contidas em altas madrugadas.

Essa chama brilha e me encoraja Mesmo que a solidão teime Em me acompanhar nestas noites Longas e lastimosas e nos dias sem graça, Monótonos como as cantigas dos grilos.

“Vá vivendo, o futuro a Deus pertence.” Deus, o único sabedor de minhas fraquezas, Ainda mostra ao meu coração Mil razões para o encantar da vida E nessa crença no falar desse anjo Branco e brando de menina velha Satisfazendo o sossego de meu espírito Dizendo baixinho em meus ouvidos:

“_Oh, menino velho, estarei sempre contigo Quando a solidão bater mais forte.”





FORÇA MAIOR



Meu pensamento não se perturba

Quando essa imagem de ti

Materializa-se em minha mente

Oferecendo o néctar dos deuses

Ao meu coração conhecedor do amargor

Da solidão

A perseguir-me o sossego.

Essa tua imagem percorrendo

O infinito das estradas

Rumando às estrelas

Provoca-nos o prazer dos encontros

Tão necessários em nossas vidas.


Vens, mulher, que de amada,

Agora passou para uma necessidade maior

De querer-te e querer-me

Como somos na simplicidade das coisas

Provocando-nos um desejo esplêndido

Para buscar a vida

Onde não há a germinação das rosas.


Para buscar a vida

Onde o desamor imperou,

E, hoje, se esvai como fumaça ao vento

Não encontrando a consistência do existir,

Porque a pureza do amar

É mais forte que a essência da vida,

E é ela que buscamos a cada instante que passa,

E é ela que nos conduz à beleza do Paraíso.


MAIS FORTE



Mais forte que eu,

Mais forte que tu,

Mais forte que nós...


É esse desejo que nos leva

À união de nossos corpos,

À realização de nossas almas

E a bênção divina desse sentimento.


Mais forte que nós,

É esse amor que não nos cega,

E nos leva a enxergar o horizonte,

E a pisar o chão com a consciência

De que amor se faz com amor

E que o ódio por si, só, se anula.


Mais forte que nós é essa força

Que nos abre os olhos

E nos une

Como se cada segundo perdido

Fosse irrecuperável

Na falta um do outro...

Por isso, por que não olharmos

Além de nossas almas

E deixarmos que os anjos

Nos iluminem nosso caminhar

Solidificando a pureza de nosso amor

Na ardência viva do fogo

Desse sentimento que,

Quanto mais queima, mais purifica

Nossas consciências e nossos espíritos?


ESCLEROPOÉTICA




Em meus poemas as palavras

Envelheceram e perderam a graça

No ritmo suave de seus versos

Quando ainda dizem “eu te amo.”


Elas buscam no azul do céu

E no mundo fantástico da poesia

A musicalidade das sílabas de teu nome

Adoçando meus lábios no ardor

E na querência maior de teus beijos.

Minhas palavras perderam o vigor

Da juventude e a beleza

Na ironia provocada

Pelo sadismo da saudade

Rindo de meus sonhos

Ainda buscando a esperança

De tua ardente companhia.


Não! Minhas palavras rejuvenescem

Quando sentem o valsar das sílabas

Marcantes de teu nome em minha boca.






VISUALIZAÇÃO



Hoje, meus olhos enxergam

O longe e a miragem

E as experiências que a vida me impôs

Quase como uma obrigação de aceitá-los

E levam-me a diferenciar

O sonho da realidade;

O Eros da Psiquê

E a aceitar o caminhar no chão,

Única estrada para alcançar os céus

E banhar-me na luz das estrelas.

Teus olhos, meus companheiros de sonhos,

Iluminam com sua luz viva

A esperança da alegria de meu caminhar,

Antes, triste e desesperado,

Hoje, vivo e real

A buscar teu corpo e tua alma

Como equilíbrio e harmonia

De meu espírito desejoso de ti.






SOLIDÃO




Às vezes, na solidão

De noites mais lastimosas,

O tempo estica a sua duração

Tornando os segundos do relógio

Momentos eternos

Que teimam em não findar.


É desta forma que não consigo entender

O porquê de se buscar a solidão

Como solução para encontrar a paz.

É assim que não consigo aceitar

A vida sem o teu caminhar comigo

Concretizando sonhos

Teimando em não nos abandonar;


É assim, na eternidade das batidas

Monótonas do relógio

Que não entendo a solidão

Como solução para a tranqüilidade da vida.








UMA CANÇÃO RÚSTICA

Nunca fui um deus.

Acho até que eles me abandonaram.

Minha ânsia de alcançar os céus

Levou ao inferno

Do esquecimento de mim.

Os rios correm para o mar

Não importando as curvas.

Os ouvidos se ferem com minha voz

E as casas fecham as janelas

À minha sombra rústica

Batendo de porta em porta.


O homem nem se importa com o homem,

Nem com as canções delicadas dos sonhos:

A poesia do cotidiano é concreta

Enquanto tortura a alma

Na desesperança da paz.


Falo de mais e as palavras

Rasgam-me o espírito

Ainda puro, ainda brando

Na negritude da realidade

Deixando-me sufocado

Na esperança da felicidade

Que foge e se esconde de minhas mãos.


Olho para o rosto do povo que passa

E vejo apenas rostos nada mais que rostos

Sem expressão e sem o brilho do olhar

Que tanto me levava ao cume da montanha.

E não mais o canto harmonioso do verso

Sente o prazer de delirar em meu poema.

Resta-me o caminhar solitário das almas,

E a mudez das palavras,

E a invisibilidade do amor

Já tão abstrato como a ilusão de sua existência



Meus olhos vêem o vulto dos rostos

Embotados de lágrimas

E apenas vulto, vulto e nada mais.

Onde colocar meus pés sugando a terra?

Onde colocar a força fugindo

De minhas mãos?

Onde buscar a vida enquanto a poesia

Perde a sua existência?


TRANSPARÊNCIA


Uma das coisas mais belas do mundo

É ver o nascer e o pôr-do-sol.

Eles nos dão uma sensação física

Da presença de Deus

Tornando-nos felizes por viver

Tendo essa dádiva divina.


Hoje, neste instante, os vejo passarem por mim

Como lixa arranhando-me a pele

E a me sufocar a voz,

Não porque sejam terríveis algozes,

Mas pela falta que fazes:

Não sentir a tua presença, em mim,

E beber o vinho amargo do desprezo

De teu coração

É ver o tempo fugir, levando a beleza

Ardente de todas as conotações possíveis

Da palavra amor.



Ele, o amor, nunca foi egoísta, nem impuro;

Ele é de uma simplicidade tão grande,

De uma pureza tão transparente

Que fica deslocado da realidade


Tão pura,

Tão crua,

Tão amarga,

Tão maldosa

Tornando esse belo sentimento numa coisa banal.


É essa pureza transparente que vai torná-lo

Mais forte que tudo que traga

O amargor das coisas impuras,

A maldade das línguas más,

A tortura do corpo físico da solidão

E as conseqüências tentando nos afastar.



As razões verdadeiras nos tornando

Pessoas amantes da vida rolando lá fora

E compreensíveis aos anseios um do outro,

Porque amar consiste em quebrar e vencer barreiras

Crescentes a cada instante como se estivessem

Tentando nos levar aos limites de nossas almas.

É a pureza do amor que nos torna crianças, Porque toda criança é como anjo Pela transparência e verdade no sentir:

Não há a lepra da mentira nas ações delas;

Toda criança é como rei Na consciência da palavra:




Palavra de rei é confiável;

Toda criança é como criança

Que se morde e se belisca

E depois se beija, e se abraça

Porque o doce de um beijo

É o melhor açúcar para alma,

E o calor de um abraço,

É o melhor apoio que

Que o ser humano pode ter.


Eu, que não mais sentia a

A vida vibrando

Em meus sonhos,

Nem o calor do sol com sua luz

Iluminando-me os caminhos,

Trago hoje, ainda latente,

A esperança

Dando-me alento para buscar a vida

Porque é em ti, em mim,

Que busco, a cada momento, viver feliz.

Um homem sem o um sonho não é um homem.

Sem o sonho não sabe sorrir,

Nem distribuir o brilho desse riso

Porque não encara, com maior veracidade,

As asperezas dos caminhos da realidade

E não tem a coragem para desbravar

  • desconhecido,

Pois não traz a certeza dos sentidos.


Oh, amada, a repetição constante

Do dizer “ eu te amo” não pode ser

Uma canção monótona a nos afastar

E, sim, mais um tijolo na construção

De nosso amor

Abstrato na visão dos outros,

Mas concreto no doce de nossos beijos

E no calor de nossos abraços.



Oh, amada, amamo-nos

E não está em nós

O poder de fugir a essa realidade.


PARTILHA


Quando se tem com quem compartilhar

Uma grande dor

A nos torturar a intimidade

De nossos corações,

A vida sorrir tranqüila

Aliviando-nos o espírito.



Um espírito amargurado e torturado

Faz-nos caminhar

Sem o equilíbrio da consciência,

E produz um fogo líquido

Queimando-nos a face

Quando a fragilidade das lágrimas

Rola vertiginosamente para o vazio

Tirando o brilho de nossos olhos.


É preciso o aconchego de um abraço

Forte, fraterno, amigo e amado

Impulsionando-nos à frente da batalha,

Tornando-nos heróis de nós mesmos,

Porque aprenderemos a cantar

Encontrando na vida, mil razões

Para vivê-la e sermos felizes.



DESCONHECIMENTO


Desconheço o amanhã e o renego

Na dúvida de tua companhia.

Olhemos o vento sussurrando Em nossos ouvidos o canto Da melodia de Eros e deixemos O mar acariciando nosso caminhar Pelas areias enquanto renovaremos O pacto de nosso amor;

E valsemos ao sabor do tempo Em busca de nos tornarmos felizes.

Vem, amada, o sol aquece o brilho De nossos olhos:

É preciso entender

A mensagem dos anjos

Que nos guardam e nos protegem

Do desamor pairando no ar.


SILÊNCIO


Esse silêncio absurdo e torturador

Nem deixa que eu aprecie

A musicalidade dos grilos,

Nem o canto belo das estrelas.

A batida do relógio, sempre monótona, Nem acompanha o ritmo Alucinante das cordas de meu coração.

A noite segue, cega, em trevas, E a luz elétrica dos portes Chega baça e acanhada Pelas janelas do quarto Mais lenta que a tristeza do tempo Teimando em não me abandonar.

Levanto-me, suspiro fundo

E o ar frio da noite

Bate desrespeitosamente em meu rosto

Levando consigo mais uma lágrima

Que deixa chagas profundas

Desfigurando o riso belo de um sonho bom,

Companheiro de noites embalando

Meu canto, quando teu cheiro,

Em minhas mãos, me acalma a alma.



TRAIÇÃO


À noite, este silêncio absurdo

Trai-me as forças

Provocando a fuga de mim,

Do homem, do sábio, do intelectual e do herói...

Daí, surge o menino desprotegido Temendo os habitantes da noite, Verdadeiros demônios invisíveis A perturbar-me o sossego.

A noite trai-me!

Este ato amargo é o fel de meu espírito Tirando-me as possibilidades De evitá-lo pelas madrugadas.


O nascer do sol faz-me

Buscar os paramentos de guerra

E meu grito ecoa pelas montanhas,

Enquanto o bárbaro guerreiro cavalga

O seu corcel pelas ruas

Numa bela imagem apocalíptica

De quem não teme o maior dos inimigos:

Solidão!

Ao chegar a noite, ela bate mais forte E sorri zombeteira de meus sonhos, E crava suas garras em meu coração, E suga as lágrimas de meus olhos...

E morro erguendo os braços às estrelas.


Onde a minha armadura,

A minha capa,

A minha espada,

A minha máscara

E o meu escudo

Fortalecendo o meu corpo,

Tornando-me o herói a combater os inimigos

Teimando em me enfraquecer a alma?

Onde andam as minhas armas Que me levam a vencer as batalhas Do maior engano de mim?

Onde anda você, amada,

Seu corpo, seu riso,

Seu olhar, a sua alma

A me darem coragem para viver?

Onde anda o seu calor A me aquecer o corpo Em noites friorentas?




Onde andam a esperança

E a coragem para sorrirem

Quando o manto da noite

Envolve o meu ser

Impossibilitando-me os sonhos?

Sim, a noite me trai

E eu nem sei que caminho seguir...

Apenas fecho os olhos

Entregando o meu corpo

Ao aconchego da cama, dos lençóis

E da solidão.

Hoje apenas espero o sol amanhecer.

Sim, simplesmente, a noite me trai!


PROVOCAÇÃO



Tento provocar, a cada minuto do dia, A alegria que possa dar alento A esse espírito moribundo Detestando o sofrer E o seu caminhar pelas sarjetas Da dor Perseguidora de meu canto Ainda feliz em teus ouvidos.

Contudo, o mundo da poesia Opõe-se ao da realidade E vago, em vão, Buscando forças na luz Maravilhosa dos teus olhos.

Desculpa-me não mais ser o herói...

Nem um deus:

As forças que me sustentam o corpo

Exaurem-se a cada passo dado

Distanciando-nos para o abraço de nosso amanhã.

Desculpa-me não mais ser o herói Para te salvar do anjo mal Da realidade que nos tortura.


Nunca fui o sonho de alguém

Porque sou real,

Às vezes, sou forte e grito

Para afugentar o medo,

Mesmo que ele seja, muitas vezes,

Mais forte que eu e me conduza

Aos cárceres da angústia

Enfraquecendo-me a alma.

Desculpa-me não ser o herói:

Eles já não me causam

Nenhuma admiração,

Nem deixam que os sonhos

Habitem meus caminhos.

Ando em estradas pedregosas Machucando-me os pés Ainda caminhando em busca Da esperança do riso puro de teu rosto Em mim, buscando o aconchego de teu peito.


O SOL AINDA BRILHA LÁ FORA


Minha fada encantada,

Cadê o brilho de teus olhos

E o riso nesses lábios maravilhosos?



Não vês que tu és mais forte

Que essa nuvem negra

Tentando, teimosamente, nos cobrir?



Olha o sol lá fora como brilha!

Ele derrama sua luz sobre os bons e os maus.

Mas só os fortes absorvem,

Entendem e refletem o seu calor.

Tu és assim:

Forte, bela, radiante

E possuidora desse reflexo solar.

Por que te deixas abater?


Contigo aprendi a cantar, Reaprendi a viver, Compreendi o meu destino, E reescrevi a nossa sina.


Hoje, tenho braços fortes para te aconchegar,

Voz altiva para te abrir os caminhos

E armas para te defender.

Olha o sol lá fora!

Ele nos aquece, nos encoraja

E nos faz ver que somos crianças

Desprotegidas longe um do outro,

E somos guerreiros, verdadeiros samurais,

Quando nos damos as mãos.

Por isso, se cairmos juntos,

Cairemos em pé e de punhos cerrados,

E venceremos a morte

Que é mais fraca que o nosso amor.

Sozinho, somos frios e fracos.

Assim, sendo, vem, demo-nos as mãos

Para que possamos cobrir de flores

A nossa estrada

E encantarmos a vida

Com a pureza de nossas almas.


REAPROXIMAÇÃO



Nossas almas são formas Unidas que se fizeram Ao longo dos dias...

Contudo, sua existência infinita

Necessita de uma consistência

Física dos corpos se fazendo presentes

Na busca um do outro

Compreendendo os conceitos de felicidade.

Não nos privemos dessa lógica divina Ofertada pela natureza A nos preparar caminhos Se cruzando a cada instante Confirmando a força e a cumplicidade Na busca de um amor constante Que a realidade torna real Na pureza de sua verdade.

É preciso que os nossos espíritos se misturem Amaciando a solidão de nossos corpos Dando paz as nossas almas.

Não nos privemos dessa realidade Reaproximando-nos E nos tornando mais verdadeiros...

...dê-nos a condição de nos tornarmos felizes.



CANÇÃO PARA UMA AMIGA

AUSENTE


Minha canção fala de ti, amiga,

Mesmo que eu lamente a tua ausência

E não tenhas constante a minha presença.

Sou um vagabundo e sem rumo vou Para onde o vento me levar, vou Mesmo que chore E minhas lágrimas queimem teu peito, Tuas palavras, teu riso e teu olhar.

A minha canção chama por ti, amiga, Mesmo que os outros estejam comigo, E cantem, e toquem, e dancem, e falem Não têm a importância Que, em meu peito, tua alma plantou.

De tudo que eu vi e vivi, De tudo que eu plantei e colhi, De tudo que eu sonhei e realizei, Nada se comparou ao que contigo aprendi...


Aprendi a viver,

Aprendi a chorar e a avaliar

Que um amigo é um bem maior

Que se pode encontrar.

A minha canção fala de ti, amiga, E nem é preciso lamentar a tua ausência Se comigo, hás de ficar sempre.


INTIMIDADE



Só conversaremos com Deus

Na intimidade de nossas solidões

Despidos dos traços negros

Da maldade tentando,

A cada minuto do dia,

A nos afastar da luz branca

E branda da esperança.

Só conversaremos com Deus, Se aliviados de uma dessas dores Que torturam a beleza Que vemos... E temos Na intimidade de nossas almas.

Só conversaremos com Deus

E, com certeza, seremos atendidos,

Se o nosso riso brilhar

Diante da vida

E de nós nos procurando

Porque só em nós mesmos reside

A certeza de um bem-querer tão forte

Quanto à essência desse amor

Solidificando-nos a canção divina

Em nosso caminhar juntos,

Conduzindo-nos à felicidade

Que procuramos e encontramos

Na simplicidade das coisas

Que nos cercam e nos sorriem.

ROMANCE - AS AMAZONAS

AS AMAZONAS
Lenda e realidade se confundem num conto de amor, misticismo, mistério e aventura.





Todos os direitos reservados a
Francisco Marques da Silva

APRESENTAÇÃO

Há dias que eu tentava escrever algo, quer fosse uma trova, um poema ou uma cena de uma nova peça teatral e nada! Parecia até que o dom de escrever desaparecera. Quanto mais eu forçava a mente, mais a dificuldade da escrita crescia chegando até mesmo ao ponto de não conseguir, nem mesmo, elaborar um período e o analisá-lo em sala de aula.
Esse tipo de crise para quem gosta de escrever é terrível. Acredito que todos aqueles que abraçaram o ofício das letras já se sentiram assim, como eu. Todavia, quanto maior a dificuldade, maior a ânsia de pôr as ideias no papel.
Foi num desses momentos de crise que me veio a ideia de escrever sobre AS AMAZONAS. Ainda nas primeiras páginas, eu não sabia como seria o enredo que foi surgindo rápido como se alguém o ditasse para que o escrevesse sem que, ao menos, pensasse em delinear algumas das características dos personagens ou mudar, aqui e ali, o rumo de alguns capítulos. Tudo, personagens, ações e capítulos já estava pronto. Na verdade, eu nunca escrevera dessa forma e gostei da experiência, até mesmo porque, ler sobre o tema, sempre me fascinou desde criança.
Ao entregar os originais para digitá-los, fui apresentado a uma moça que, ao me cumprimentar, beijou-me os lábios, os olhos e a testa e, rindo, disse:
Você gostou muito do que escrevera, não?
Claro, respondi gaguejando.
Tenha calma, muitas coisas ainda estarão por vir. Espere chegar a hora e leve o seu projeto adiante.

Depois se afastou e desapareceu no meio das pessoas presentes na sala em que estávamos.

Fiquei intrigado com a cena, com a moça e com a coincidência de sua ação com a de um dos capítulos do livro. Dela, apenas um leve perfume de rosas ficou em minhas mãos e uma lembrança viva de seu rosto me olhando e rindo.

Acredito que fosse uma das guerreiras e, quem sabe, me ditou o texto telepaticamente?

AS AMAZONAS

Mulheres guerreiras que, segundo lendas da mitologia greco-romana, não conviviam com homens, a não ser em época de acasalamento.
Embora habitassem o Cáucaso e as fronteiras da Cíntia, transferiram o seu habitat para outras regiões à medida que os gregos avançavam e expandiam suas conquistas no Mar Negro.
Atribui-se a elas, a fundação de várias cidades, entre as quais Éfeso, na Ásia Menor. Lutaram com os gregos em Troia, tendo perdido Tentessiles, uma de suas rainhas. Invadiram Atenas quando Terseu rapta Antíope e Hércules arrebata o cinturão da rainha Hipólita. Nessa batalha, foram aniquiladas.
Suas armas são o arco, a flecha, a lança, o dardo, o machado de dois gumes e um escudo com os quais são representadas na arte montada em cavalos.

Toda essa lenda clássica e mais outras foram revividas quando o explorador espanhol, Francisco de Orelhana ( Séc.XVI ), desce pela primeira vez um rio que, pouco depois, recebe o nome de Amazonas. Lá, o explorador encontar mulheres guerreiras, aproximadamente pela foz do rio Janumbá, no interior da floresta. Eles travam, então, grande combate; conta-se, também, que tinham uma rainha chamada Canhori, comandante de, aproximadamente, 70 aldeias.
Elas se vestiam de uma lã finíssima, usavam cabelos longos e, na cabeça, traziam uma coroa dourada; quando em casa, ao amanhecer, abriam a janela e deixavam o sol entrar iluminando o ambiente e o agradeciam por isso; depois iam apanhar os muiraquitãs ou pedras verdes no fundo do rio para oferecerem aos escolhidos como símbolo de felicidade eterna.

Era uma tarde quente aquela de agosto de 88. Talvez, uns 36, 37 graus, eu não me importava muito. A loja, aliás, a imensurável loja de eletrodomésticos estava sufocante e por mais que ajustasse os aparelhos de ar-condicionado não adiantava. Havia muita gente transitando, olhando as vitrinas e, para minha tristeza e desconforto, nada de vendas naquele dia. Parecia e era verdade, o dinheiro era pouco e os aparelhos cada vez mais caros.

Havia mais de cinco meses que a situação era a mesma. Eu pensava que já estava pagando para trabalhar... e estava. Gostaria de ter mudado de ramo, mas fazer o quê? De um lado, o desemprego aumentava ou diminuía nas promessas dos políticos, rolando no ar, naquele ano eleitoral e, por outro, não apareciam, nos editais, oportunidades de concursos.

Era nesse clima terrível, político e social daquele ano que aumentava a minha depressão. Não era bem depressão, era frustração por eu não ter, àquela altura do campeonato, realizado alguns sonhos. Coisas simples: viagens, expor alguns rabiscos nas galerias da cidade ou encher o peito de medalhas nos torneios de karatê regionais. Enquanto me perdia nos sonhos, perdia uma venda, a única do mês.

Outra semana. Tudo seria o mesmo se, mesmo com a preguiça normal de segunda-feira, o dia não tivesse sido iniciado com uma boa venda, à vista, e o chefe do setor pessoal mandasse me chamar para dizer que, a partir daquele dia, eu entraria em férias. Recebi o comunicado com alegria e, ao mesmo tempo, com a preocupação por saber que seriam trinta dias em casa. Talvez, sair com alguma namorada, assistir a alguns filmes, beber umas cervejinhas nos barzinhos esperando as férias acabarem e continuar novamente tudo do mesmo modo que antes.

Saí do departamento contente pelo comunicado. Ao chegar à rua encontrei um velho amigo, batemos um papinho, fomos a um barzinho, trocamos umas idéias e matamos o tempo naquela conversa sem nenhuma importância, indo de mulheres à política, mas ainda sem objetivo ou convicção na defesa dos pontos de vista, apenas conversas.

Despedimo-nos já tarde. Andei despreocupado pelas ruas olhando as vitrinas pelo lado, de fora das lojas e deparei-me, curioso, numa agência de viagens.

Olhei os cartazes, muito bonitos, por sinal, e um chamou-me a atenção por oferecer uma turnê pelo alto Amazonas. Sabe daqueles momentos que você se isola do mundo ao redor e não vê mais nada? Foi assim que eu fiquei. O mundo que estava na minha cabeça era um tropical, cheios de perigos, bichos desconhecidos e fantásticos que eu ouvira falar quando criança.

Ao longe, bem distante mesmo, uma voz fraquinha cumprimentava-me, desejando-me “boa tarde,” “bom dia” sei lá o quê... Eu estava perdido e sentindo-me ainda mais distante do que a própria distância da voz que, quanto mais distante, mais doce, mais suave e, aos poucos, foi entrando sem permissão nesse meu mundo, como se naquele instante nossos caminhos se cruzassem num encontro previamente marcado e, pela primeira vez, dirigi-lhe entanto o olhar... o olhar, aquele olhar dizia tudo.

Não sei por quanto tempo, fiquei parado olhando pra ela. Acho que foi por muito tempo, porque ela ria encabulada de ter-me perturbado. Era uma moça com seus dezenove anos, bem vestida com um terno azul, saia da mesma cor e uma blusa branca por dentro do terno que contrastava com o vermelho claro do batom de seus lábios que, se eu não estava sonhando, diria que ouvi vagamente sair daqueles lábios sensuais uma canção de encantamento qualquer. Algumas palavras que ela pronunciara, eu não compreendi e, num sobressalto, pulei fora daquele sonho acordado:

- Vi que você estava impressionado com a fotografia do cartaz. Gosta de florestas misteriosas? Perguntou-me.

Droga! Onde eu estava com a cabeça? Eu não poderia ter ouvido encantamento nenhum. Aquela moça era apenas uma recepcionista da agência. No

- Gosto - Respondi ainda com o mesmo êxtase de antes.


Gostaria de receber opiniões a respeito do trecho.